São 155 assassinatos por dia, cerca de seis
por hora nos Estados brasileiros; número é 6,79% maior do que no mesmo período
do ano anterior
O Brasil já ultrapassou a marca dos 28 mil
assassinatos cometidos neste ano. De acordo com dados fornecidos pelas
secretarias estaduais de segurança pública, no 1º semestre o País chegou a 28,2
mil homicídios dolosos, lesões corporais seguidas de morte e latrocínios
(roubos seguidos de morte). São 155 assassinatos por dia, cerca de seis por
hora nos Estados brasileiros, onde as características das mortes se repetem:
ligada ao tráfico de drogas e tendo como vítimas jovens negros pobres da
periferia executados com armas de fogo. O número é 6,79% maior do que no mesmo
período do ano passado e indica que o País pode retornar à casa dos 60 mil
casos anuais.
O aumento acontece em um ano marcado pelos
massacres em presídios, pelo acirramento de uma briga de duas facções do crime
organizado (Primeiro Comando da Capital e Comando Vermelho), dificuldades de
investimento dos Estados na área e um plano federal de apoio que avança menos
que o prometido.
Em âmbito local, o aumento é puxado pelas
elevações registradas em Estados nordestinos, como Pernambuco. Se o País teve
1,7 mil homicídios a mais neste semestre, boa parte, 913, se deve à derrocada
do Pacto Pela Vida, programa pernambucano que vinha conseguindo reduzir os
assassinatos na última década, enquanto a região mantinha a tendência de alta.
A onda de violência tomou as cidades
pernambucanas, assim como foi intensificada no Ceará e no Rio Grande do Norte.
Quatro dos 11 Estados que tiveram aumento no ano estão no Nordeste.
Se as disputas relacionadas ao tráfico de
drogas explicam parte da alta, é necessário, em outra medida, alertam
especialistas, entender como essa dinâmica funciona. O professor da Pontifícia
Universidade Católica de Minas (PUC-Minas), e ex-secretário adjunto de Defesa
Social do Estado, Luis Flávio Sapori se debruçou sobre inquéritos de homicídios
de Belo Horizonte e Maceió para testar essa máxima.
Em estudo divulgado neste mês, chegou a
conclusões importantes. “Os dados empíricos apresentados até o momento
confirmam que a principal motivação dos homicídios nas capitais estudadas
deriva de conflitos no mercado das drogas ilícitas. Entretanto, os patamares do
fenômeno são bastante inferiores ao que é geralmente propagado por autoridades
políticas e de segurança pública.”
Ele explica que o tráfico e os traficantes
acabam por gerar uma “difusão da violência”. “Nas relações afetivas, nas
relações familiares, nas relações de vizinhança e na sociabilidade cotidiana,
os comerciantes das drogas ilícitas tendem a utilizar o mesmo padrão violento
de resolução de conflitos vivenciado nas relações estritamente econômicas com
parceiros, com concorrentes, com fornecedores e com clientes”, diz. “E a posse
da arma de fogo é elemento decisivo nesse fenômeno”, completa.
O professor destaca que as conclusões, com base
nessas duas cidades, podem ser usadas na análise da realidade do País. “Isso
explica boa parte do que está acontecendo nas cidades brasileiras, onde o
tráfico se consolidou como matriz dos homicídios. Mas é necessário fomentar
estudos locais para entender as singularidades e levá-las em consideração na
elaboração de políticas públicas”, diz.
A antropóloga e professora da Universidade do
Estado do Rio (Uerj) Alba Zaluar atribui o aumento da violência ao “fim do
investimento nos projetos e nas polícias estaduais comprometidas” com a
prevenção. Ela lembra os exemplos do Pacto pela Vida, em Pernambuco, o Fica
Vivo, em Minas, o Estado Presente, no Espírito Santo, e as Unidades de Polícia
Pacificadora (UPP) no Rio. “Os efeitos benéficos começaram a ser revertidos,
agora ainda mais evidentes pela ausência de investimento público neles. Em
diferentes porcentuais, as taxas de homicídio voltaram ao padrão observado em
2009, antes da implementação desses projetos”, escreveu ao Estado.
“Se os projetos queriam ganhar os jovens
atraídos pelos comandos de crime organizado que atuam hoje em todo o território
nacional, seria também crucial fazer com que a atração exercida por este
importante ator nas trevas das atividades empresariais diminuísse. Infelizmente
não diminuiu”, diz. “Nada foi feito para mudar essa atração pelo negócio ilegal
altamente lucrativo. Enquanto nada for feito, vamos ficar investindo muito para
ver todo o gasto ir embora pelo ralo.”
O Ministério da Justiça foi questionado pela
reportagem sobre a elevação do semestre no País, mas não comentou. Sobre o
Plano Nacional de Segurança, destaca que “os investimentos inicialmente
previstos foram revisados e adequados com a realidade financeira da União e
perfeitamente absorvidos pelos Estados, que adaptaram as ações propostas de
modo a atingir os resultados. Paralelo a isso, ações de capacitação e doação de
equipamentos estão sendo realizadas.”
Agência Estado
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